Ao pesquisar sobre um dos marcos mais emblemáticos da Trofa, encontrei esta crónica do Jornal da Trofa. Decidi pública-la, pois nunca li um texto que a divulgasse de forma tão apaixonada e saudosista. Ao que ouvi, e agora a ler sobre a Ponte Pênsil da Trofa tenho pena de nunca a ter visto e a ter pisado... Abro caminho ao cronista Costa Ferreira do Jornal da Trofa...
A ponte pênsil da Trofa e outras recordações
O trabalho que está a ser realizado pelo Pelouro do Arquivo Municipal é digno de ser evidenciado e melhor conhecido e a este assunto já dedicamos, recentemente, uma destas crónicas semanais. Trata-se da recolha, classificação e digitalização de documentação antiga respeitante à área do actual Concelho da Trofa.
Os usos e costumes, as tradições, a forma de estar e de conviver, as práticas inerentes aos mais diversos eventos, tudo deve ser conservado em arquivo, para que a presente e futuras gerações possam consultar tal documentação e, através dela, compreenderem melhor o "modus vivendi" de outras épocas.
Também nós, nestas colunas, sempre que surge uma oportunidade, gostamos de recordar outros tempos e falar um pouco de coisas do passado. Para tanto, recorremos à memória, quando se trata de eventos ainda do nosso tempo, ou consultamos documentação antiga, quer em livros, quer em folhas amarelecidas pelo tempo que vamos recolhendo um pouco por todo o nosso Município.
Hoje podemos lembrar que foi em 1858, precisamente há 150 anos, que as margens do Rio Ave ficaram ligadas pela "linda Ponte da Barca da Trofa, que passa por ser a mais elegante do Reino", como escreveu Alberto Pimental na sua obra "Santo Tirso de Riba d'Ave".
De facto, naquele ano ficava concluída e era inaugurada a célebre e histórica ponte pênsil da Trofa, destruída em meados da década de trinta do Século XX, para ser substituída pela actual em betão armado.
É decorrido, portanto, século e meio sobre a data da inauguração desse belo e artístico monumento que, ainda hoje, se tivesse havido bom senso e fossem escutadas as razões dos Trofenses, poderia constituir, como o foi durante a sua existência, um notável "ex-libris" do nosso Concelho.
Geração após geração, nas conversas de pais para filhos, na divulgação de fotos e desenhos e em documentos literários, em prosa ou em verso, a ponte pênsil da Trofa continuará a ser evocada com nostalgia.
Pertencemos a uma geração que ainda conheceu esse belo monumento e por mais de uma vez, nos primeiros nos da década de trinta do Século XX, tivemos o privilégio de atravessar essa ponte que fazia a ligação rodoviária entre as duas margens do Ave.
Ao recuarmos no tempo, outros temas, também relacionados com o Rio Ave, nos ocorrem de imediato. Aliás, a margem esquerda daquele curso de água, em S. Martinho de Bougado, mais concretamente na zona da Barca, é um local histórico por muitas e boas razões.
Foi local de passagem a vau para a margem direita; carros de bois e carruagens puxadas a cavalo ali começavam a travessia do rio, quando a corrente não era demasiado forte; o leito estava empedrado, para impedir que as rodas se enterrassem na areia; a jusante do açude, havia barcos para a passagem de pessoas e mercadorias. O porto de Fromariz, o Estreu, a ponte de pau ("singular e rudimentar passadeira-flutuante", como escreveu António Máximo), a resistência aquando das invasões francesas, etc. tudo são factos e efemérides inerentes a todo um passado que urge não olvidar.
Espera-se que o anunciado e desejado "parque das azenhas" conserve e faça reviver essas páginas da História Trofense, sem esquecer a necessidade de restaurar, e fazer regressar a local de público acesso, as "Alminhas da Barca", que também assinalam uma época e estão associadas à travessia do Ave nesses tempos distantes e ao sentimento religioso da nossa gente.
A passagem do Rio Ave, na Barca (Finzes), na ligação por estrada entre o Porto e Braga, terminou quando foi concluída a ponte pênsil, em 1858. De referir que primeiro foi aberta ao trânsito a EN 14, no antigo traçado pela Ponte da Pedra, o que aconteceu em 1852, mas a travessia do Ave, ainda durante alguns anos, continuou a ser efectuada sobre uma rudimentar ponte de madeira.
Entretanto, a Companhia de Viação Portuense conseguiu o exclusivo, a partir de 1855, da exploração do transporte em diligência, nas estradas Porto-Braga e Porto-Guimarães, incluindo o serviço do correio (a mala-posta). E dadas as dificuldades e a perigosidade na travessia do Ave, na tal "ponte de pau", aquela Companhia assumiu a responsabilidade da construção da Ponte Pênsil da Barca da Trofa (como ficou oficialmente designada), cuja inauguração ocorreu em 1858, há século e meio precisamente,
As diligências, carruagens puxadas por duas ou três parelhas de cavalos, levavam uma média de 6 a 7 horas na ligação Porto-Braga, incluindo o tempo gasto nas paragens em vendas ou estalagens, que existiam ao longo do percurso. Pouca demora, no entanto, quando comparada com o tempo gasto com um carro puxado por juntas de bois (o designado carroção), que levava cerca de dois dias a fazer o mesmo percurso.
Mas a segunda metade do Século XIX é toda ela um "viveiro" de grandes acontecimentos, todos eles valiosos componentes do alicerce em que foi assentando, progressivamente, o desenvolvimento da Trofa. Assim, em 1852, fica concluída a estrada Porto-Braga; em 1855, começam a circular, nessa rodovia, as diligências da Companhia de Viação Portuense, ligando aquelas duas cidades e servindo também a nossa terra; em 1858, é inaugurada a ponte pênsil; em 1870, ficou concluída a estrada Santo Tirso-Vila do Conde; em 1875, é inaugurada a Linha do Minho, com circulação de comboios entre Porto e Braga, o que constituiu a mais forte alavanca do progresso da Trofa.
Enfim, tudo eventos do passado, dignos de serem relembrados no presente, pois fazem parte da nossa história, da nossa memória colectiva, de que todos os Trofenses se devem orgulhar. Por isso, devemos incentivar e louvar o trabalho que vem sendo realizado pelo Pelouro do Arquivo Municipal.
Costa Ferreira